sábado, 30 de agosto de 2008

European Son - The Velvet Underground





Sentiu-o como uma parede de tijolo contra a sua cara. A pele moldou os ossos da mão duros e fortes e o olho fechou-se automaticamente com força. O maxilar entortou-se e a cabeça foi virando, agora desprotegida pelo chapéu que caiu. A bochecha ficou apertada contra os dentes e à medida que a força largada pela mão se libertava, a carne mole e humedecida pela saliva era ferrada pelos dentes. Abriu-se esta carne deixando o sangue fluir para dentro da boca e a gengiva cedeu um dente, que foi cuspido. Olhou o adversário com fúria, preparou-se para investir rangendo os dentes. Formaram-se pequenas rugas em torno do nariz e debaixo dos olhos à medida que os dentes se mostravam. Ficou com a expressão de um lobo enraivecido, pronto a morder. Os músculos tornaram-se tensos, o touro dentro dele estava prestes a ser libertado, sentiu um calor súbito todos os membros do seu corpo descarregado pela adrenalina. Pegou na garrafa de vinho meio cheia à sua frente e rachou-a em mil cacos na cabeça do indivíduo. O líquido escorreu pelo cabelo oleoso e salpicou tudo à sua volta. O segundo indivíduo cambaleou com o choque e caiu em cima da mesa atrás partindo-a ao meio. Dois homens sentados na mesa partida levantaram-se de rompante e um deles pegou numa cadeira esbarrando-a em direcção ao primeiro. Este baixou-se a tempo de evitar a cadeira que se desfez em mil pedaços. O homem atrás do balcão guardou apressadamente todos os copos e garrafas e escondeu-se debaixo do balcão assustado. Tremiam-lhe as pernas e teve que gatinhar até a outra ponta do balcão para buscar a sua espingarda mas foi interceptado pelo corpo de outro indivíduo lançado no ar contra a parede, que tombou à sua frente no chão. Deixou-se ficar ali. Viu esse indivíduo levantar-se de novo e saltar como uma pantera para cima da sua presa. Ouvia estrondos de cadeiras a desfazerem-se em corpos, tombos no chão, socos, gemidos de dor, gritos, tilintar de esporas, pontapés, encontrões contra as paredes, gargalhadas e uivos. O Barulho e a Algazarra instalaram-se no seu bar. Um cego levou com um pé de uma cadeira no nariz. Um homem mais alto encontra uma nota deixada no chão e precipita-se a apanhá-la. O primeiro indivíduo corria para a porta mas tropeça no homem alto, que lhe dá um pontapé no estômago pensando que lhe iria roubar a nota e deixou-o tombar no chão agarrado ao estômago, mas o tombado segura a bota do homem alto ferindo-se numa espora que rodou com a queda do homem alto. Este ficou descalço mas não largou a nota, e, preparando-se para entrar no banzé, guarda-a nas ceroulas. Mergulha de novo no chão e investe murros e pontapés a quem lhe aparece à frente. Levanta-se o cego agonizado a farejar a saída mas leva com nova agressão, desta vez foi no pé, uma bruta pisadela com a parte do salto de uma bota. Gritou de dor e atira as mãos aos pés, obstruindo o meio do salão e provocando logo uma série de quedas. Começam então aos pontapés no pobre cego que responde à paulada com um pé de uma cadeira estilhaçada. Um cão foge para a rua com o rabo entre as pernas e é logo seguido de um corpo arremessado porta fora, que se levanta e inicia uma corrida frenética rua abaixo. O seu adversário segue-o também a correr e a saltar, seguido por outros tantos dispostos a continuar as investidas. O dono do bar continua sentado debaixo do balcão à espera que a algazarra acabe. Agora há menos barulho, talvez só estejam quatro ou cinco a golpearem-se. Estende o braço, segura na espingarda e levanta-se logo de seguida. Muito hirto lança um tiro ao ar. Os restantes olharam em direcção ao balcão com os olhos assustados e orelhas em pé, como hienas que avistam leões, largam as suas presas e correm dali para fora atropelando-se uns aos outros antes que sejam abatidos. Restou o homem atrás do balcão, dois corpos caídos a gemer em cada lado do salão, casacos rasgados, uma bota e vários chapéus pisados e rotos, cadeiras e mesas quebradas, paredes com rachas e o chão cheio de terra largada pelas botas e esporas, pingado de sangue, molhado por poças de vinho e muitos vidros a brilhar no chão como pequenas agulhas que reluziam com os raios do sol infiltrados pela porta escaqueirada assim como três dentes de ouro, fora os dentes de cálcio. O dono do bar continuava na mesma posição muito direito e o rosto ruborizava à medida que analisava os estragos. O cão espreitou por debaixo da porta e preparava-se para entrar mas foi surpreendido por um novo tiro em direcção ao tecto projectado pelo dono do bar e fugiu ganindo de medo. O homem atrás do balcão suspirou, sentiu uma areia cair-lhe em cima da cabeça careca. Olhou para cima e viu cada vez mais próximo um pedaço do tecto que desabou devido ao tiro. Sentiu o embate frio e duro em cima da sua cabeça. Fechou os olhos com muita força e desmaiou no chão.

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